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18 setembro 2024

Capítulo 7 - Eu, uma porta e... O maldito cavalo? Pt. 1

 


   O relato que vos irei lhes contar agora se passa algum tempo depois da execução, recordo-me que fui liberto pela besta horrenda, ou melhor, por bajin; foi após a libertação, pelos caminhos sinuosos daquele lúgubre lugar tedioso e desgastante, que por horas procurei pela porta até que em um vislumbre tênue a vi em uma sala pequena, ao me aproximar, notei de fato algo intrigante; todos os guardas, todas coisas, tudo a minha volta estava parado, era como se o tempo tivesse esquecido de seu dever cívico de realizar suas tratativas naquele domínio fúnebre da prisão. Ao entrar na pequena sala, catei uma corrente e a coloquei em meus braços, me aproximando da porta pensei em abri-la, “tolo, esse presente não é para você!” eu pensei, amarrando-lhe em minhas costas como uma mochila “Deus, aquela porta era pesada, algo a meu ver feito de uma das aroeiras¹ mais ríspidas que o velho devia ter encontrado”. Recordo-me de ter abaixado um pouco as pernas naquele dia, lembro-me de ter ficado um pouco louco por pensar que aquela maldita porta pesada carregava consigo o espírito daquele MALDITO CAVALO! Pois aquele ser infeliz e xucro, dotado de uma falta de caráter tamanha que até o pior dos ladrões possuía maior dignidade, ao ver-lhe em minha frente após colocar a pesada porta em minhas costas, de leve chorei e ri ao mesmo tempo.

   O cavalo continuava a me observar e eu por fim o ultimei “Agora seu tosco cavalo ríspido e ignorante, não tenho mais amarras, posso-lhe matar a hora que eu quiser!”, maldito seja esse cavalo, cuspiu-me a cara e beijou-me, dei-lhe um soco na cara e ali começou uma briga que só viria a terminar no outro dia. Acordei em uma outra sala com a porta escorada no chão, o maldito cavalo deitado no chão (Achei na época que ele estava dormindo) e por fim Bajin me olhando; não me assustei ao vê-lo, mas aquele maldito clima opressivo, a catarse crescente e o som do silencio absoluto me diziam sem palavras onde eu estava, havia sido levado para o escuro. Bajin se levantando formalmente e me cumprimentando educadamente, como de praxe, dizia a mim “Muito boa noite, meu caro Enoque, receio que já tenha conhecido seu guia, este é...”. Este foi um fato cômico, lembro que interrompi Bajin e gritei como um louco “A porcaria de um maldito Equino! Um ser rudimentar e patético como esse não merece nome, Bajin!”, sua expressão após minhas palavras eram singelas, ele então me disse “Então ele agora, se chamara Equino apenas”. Dos detalhes do conceito de nossa conversa naquele momento, se tornaram agora em minha mente, um fardo lúgubre e tênue, não me recordo precisamente dos detalhes, mas sei que Bajin pediu ao cavalo que me acompanhasse até o fim do mundo, seguindo o caminho dentro do Escuro, ele indagou também que se chegássemos lá ainda sãos, poderíamos assim então cumprir o desejo do velho e que ele em pessoa nos levaria até a presença do Rei Sansha Kali, que ficava ao que me recordo no verdadeiro “Escuro”.

   Ao questionar Bajin sobre o que era de fato o “Escuro”, disse-lhe o que pensava ser antes que ele me outorgasse a resposta, com seu semblante apático sem emoção ele educadamente me explicou o que era o “Escuro” em forma de um conto épico.

 

O escuro não foi criado por Deus

O escuro não foi criado pelo Diabo

O escuro nunca foi criado

O escuro sempre existiu

O escuro é o fim de tudo que não é aceito

O escuro é a base de tudo

O escuro não deve ser citado por ninguém

O escuro não é terra de ninguém

O escuro é terra daqueles que possuem o domínio

O escuro foi conquistado

O escuro é lar de muitos

O escuro não tem começo nem fim

O escuro é um lugar maldito

O escuro consome e sucumbe todos que o tocam

O escuro corrompe todos que o veem

O escuro foi moldado com base na vontade daqueles

O escuro é um sinal do fim

O escuro é lar de um dos cavaleiros de Deus

O escuro foi escolhido por Deus como a morada dele

O escuro o rejeitou e o consumiu

O escuro já teve inúmeras formas

O escuro foi nunca foi tocado por Deus ou pelo Diabo

O escuro é lar da morte

O escuro é terra neutra

O escuro pertence a morte agora

O escuro já pertenceu a um rei a muito tempo

O escuro foi lar de Magnus a muito tempo

O escuro existe em todos os lugares

O escuro é o medo primordial da humanidade

 

   Bajin em sua explicação, ao que me recordo, contou-me que antes da criação da terra de tudo que conhecemos como conceito de realidade e existência, o escuro era tudo que existia e em algum momento, naquela época, Deus surgiu em nossa existência trazendo consigo toda a luz para o escuro, mas o escuro não ficou satisfeito com a aparição de Deus na sua existência, ele por sua vez entregou a Deus uma parte da existência, parte esta que Deus criou o universo através de um único estalo. Recordo-me de que Bajin me contou que o escuro viu no planeta terra uma oportunidade perfeita para pela primeira vez tentar se manifestar, viu nos humanos a oportunidade de barganhar. Lembro-me também de ouvir que o escuro nunca mais se manifestou após Lúcifer lhe pedir ajuda para lutar contra Deus, as palavras ditas pelo escuro naquele dia perpetuam no portal que liga o mundo real com esta dimensão oculta, portal esse que fica no fim do mundo

 

Quis es tu qui non est sed creatus” ²

   Dizem que após esta pergunta retorica os acontecimentos bíblicos do anjo caído se sucederam e que após tais acontecimentos o escuro se calou de vez, os anjos caídos que apoiaram Lúcifer e tentaram ver a verdadeira face do escuro foram corrompidos pela escuridão pura e se transformaram em verdadeiras abominações, criaturas estas foram aprisionadas no próprio corpo do escuro, res a lenda que todos aqueles que olham em direção ao escuro veem uma forma diferente, veja tu que lê este manuscrito e diga-me o que viste em sua plenitude:



¹- Aroeira é uma árvore muito comum no brasil, sua madeira é rígida e comumente usada para moveis de maior rigidez como mesas, cadeiras, guarda-roupas e até portas.

²- Em latim: Quem és tu que não existe, mas sim criado?


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